008.MASSANGULO - Operações

NOTA
Neste capítulo não pretendemos lembrar ou descrever todas as operações executadas pela nossa Companhia. Foram muitas, mesmo muitas. Aqui apenas são referidas as que se realçam mais na nossa memória ou nos nossos registos pessoais.



Localização no Distrito do Niassa
MASSANGULO - Zona operacional.
CATUR - dependência hierárquica.

VERMELHO - Local de acção AZUL- Locais de contacto e/ou dependência


Reconhecimento aéreo 
Após a nossa chegada a Massangulo o Comandante do Batalhão 1936, em Catur, Ten.Coronel Luís Vilela accionou uma visita aérea à zona operacional da responsabilidade da nossa Companhia. O "convidado" foi o Capitão Acácio Tomás.




Comentários
Acácio Tomás- Quando cheguei a Massangulo, o Sr. Comandante do B.Caç.1936 pediu um voo, numa DO para me mostrar a Zona de Acção da C.Caç.2418.
No dia aprazado a DO não estava operacional e por isso veio um T6 que só tem dois lugares (Piloto e Co-piloto). O meu assento, tal como o do Piloto, era um pára-quedas dobrado e pronto para o salto. Eu, feito "valentão", mas cheio de medo, perguntei ao Piloto o que devia fazer se o motor falhasse, pois sabia que ele não planava.

Ex-Comandante da C.Caç.2418



18.Ago.1968 -A 1ª saída do 4ºG.de Combate 
Comandados pelo Alf.Neto iniciamos a nossa primeira incursão no mato. 
Éramos “CHECAS”. 
Escoltados até ao ponto de início da marcha apeada, começamos a caminhada pelas 8h00. Chegamos ao objectivo (linha de comboio junto a um rio) cerca das 17h00. Caminhada longa (nove horas e uma pequena paragem para comer) porque o guia se enganou no percurso, por duas vezes. 
Estranha sensação a de caminhar entre o capim, com mais de 2 metros de altura e mato denso,  de difícil progressão e sem visibilidade… dava medo… a todo o momento receávamos ser atacados! 
Éramos “CHECAS”! 
Descansamos uma hora, junto de uma pequena ponte; retomamos a caminhada e num morro, mais à frente, passamos a nossa primeira noite no mato, muito fria e húmida. Os sacos de dormir ajudaram a suportar essa primeira noite no mato. 
Seria mesmo o frio (?) ou a primeira sensação de insegurança “real”?
Éramos “CHECAS”! 
Este estado psicológico foi amansando nas incursões e operações seguintes. 
Regressamos no dia seguinte.
O capim
O mato
Comentários:
Ferreira da Silva - CHECAS eram os chegados de fresco à cena da guerra: Checas em Moçambique, maçaricos em Angola, periquitos na Guiné. Todos sofriam do mesmo mal, nuns mais justificado que noutros: Cagaço.
Fernando Carvalho - Confrontamo-nos muitas vezes com obstáculos assustadores. Desde o capim altíssimo, ao mato cerrado, à travessia de rios. Em todos estes obstáculos estava presente a insegurança e o risco. Caminhávamos em espaços para nós completamente desconhecidos, nos locais de vivência do nosso inimigo.



23.Set.1968 - NANI 1
Foram muitas as operações, da C.Caç.2418, de patrulhamento, acção e controlo de zona, na região de Massangulo. As Cantinas do Pierino, Muitambe, Ananases-Kitamba, Maleta, Caracol, Nani e muitos outros. 
A chamada volta do Nani era a operação mais morosa, difícil e perigosa.
No Nani, numa operação em 23.Set.68, encontramos uma pistola-metralhadora PPSH (Russa), na zona fronteiriça, escondida no mato. Foi grande o júbilo pela “primeira arma encontrada”. Naquela época para nós, capturar armas ao inimigo, era um troféu glorioso. Encontramos também uma máquina de costura, livros em inglês e diversos utensílios. 
Na chegada ao aquartelamento a Berliet buzinava continuadamente… parecia uma festa. O capitão intrigado e com um ar apreensivo não compreendia todo aquele alarido. Quando soube do acontecido abraçou o Neto efusivamente. 
Era uma 1ª vitória dos “checas” da CC2418.


pistola-metralhadora PPSH (Russa)
Acácio Tomás - Depois de refeito daquele alarido assustador fiz questão de ter uma foto com aquela arma apreendida. Era como um troféu!





15.Out.1968 - VIGILÂNCIA E CONTROLO DO INIMIGO 
Em 15.Out.1968 iniciámos uma importante operação com a missão de vigiar toda a fronteira, na nossa zona de acção, destinada a detectar infiltrações do inimigo.
Empenharam-se três Grupos de Combate, dispersos por diversos pontos de uma picada fronteiriça.
No dia 16 estabeleceu-se o primeiro contacto com o inimigo – houve uma troca intensa de fogo. Dadas as desvantagens, numérica e posicional, do grupo envolvido, o Cap.Tomás saiu com alguns militares em auxílio. Talvez o barulho da viatura tenha assustado o inimigo, pois não foi preciso mais qualquer intervenção.
No dia 18, estando situados mais a Sul, detectamos um grupo inimigo que se deslocava pela picada. Foi lançado um Dilagrama (lançador de granadas de mão pelo disparo da G3) que os dispersou. De imediato foi lançada a perseguição e foi capturado um elemento inimigo, que se tinha escondido, apesar de armado com uma Kalashnikov e uma Pistola. Foi o Furriel Carronda que o dominou quase num corpo a corpo. Interrogado no Quartel, declarou chamar-se Sabite Bonomar e ser o Chefe da Base do Maleta. Após a comunicação ao B.Caç.1936 foi-nos ordenada a entrega imediata deste elemento em Catur, o que foi feito apesar de ser noite, pouco pessoal disponível e outro cansado. Posteriormente o Cmt.Ten.Cor.Luís Vilela justificou a pressa... é que estava preso, em Catur, o 2º comandante da Base do Maleta pelo que havia urgência em os confrontar, ver a reacção deles e confirmar aquelas hierarquias da Base referida.

Nota: Mais tarde soubemos que o nosso capturado, Sabite Bonomar, conduziu a 4ª Companhia de Comandos, numa operação em que foi destruída a Base Geral do Catur.


COMENTÁRIOS
Fernando Lopes - Também participei nesta operação. O objectivo era ir interceptar um grupo que haveria de passar em determinada zona afecta a Massangulo. Depois de efectuado parte do percurso em viatura e outro a pé, fomos parar a um morro mais ou menos elevado. Passamos aí a noite com um frio de bater o dente. Ao romper do dia, aconchegados com os primeiros raios de sol, muitos aproveitaram para dormitar um pouco, já que a noite fora madrasta. A certa altura, alguém que tinha uns binóculos, alertou que, lá ao longe e pela picada que passaria pelo sopé do morro onde nos encontrávamos, se aproximava um grupo bastante numeroso. Chegou-se a contar, penso, até 10. Não foi possível contar mais porque um certo "formigueiro" começou a tomar conta da malta. Então foi dada ordem ao Fur.Carronda para se deslocar, com a respectiva Secção, para um pequeno morro que ficava mais ao lado (100/150 metros), a fim de ser ele a desencadear as hostilidades, na expectativa de os fazer retroceder e, assim, virem ao nosso encontro. As coisas não correram muito bem ao Fur.Carronda tendo provocado a dispersão do grupo inimigo que fugiam como gazelas (não era para menos) pela mata fora. Havia um elemento desse grupo que se notava mais que os outros pois vestia umas calças brancas. Pois foi esse mesmo que, feita uma "batida" acabou por ser capturado com o armamento já mencionado. Era o capitão Sabite da Base do Maleta, segundo dizia ele. Já que todos, melhor ou pior, tinham conseguido fugir, estranhou-se ter sido ele o único a ser capturado. Interpelado sobre tal facto, disse: "Mim querer fugir, mas medo fez ficar. Fogo maningue ". Pois foi. As calças brancas fizeram incidir sobre ele a maior parte do nosso fogo. Uma vez denunciada a nossa posição, regressamos ao nosso quartel em Massangulo, cansados mas sem qualquer ferido. 



21.Nov.1968 -A primeira baixa
Já nas viaturas, regressávamos de mais uma operação. A picada era estreita, sinuosa, com muitas saliências e buracos – situação muito natural no nosso ambiente operacional. Alguns dos nossos companheiros sentavam-se, com frequência, na traseira das viaturas com o taipal baixado. Numa das viaturas aconteceu a fatalidade. A viatura saltou ao passar por uma saliência, o pessoal sentado na traseira saltou também e, um deles, quando caiu na picada… foi fatal... bateu com a cabeça provavelmente numa pedra. 
Baixa por acidente do Manuel Peixoto MENDES, de Amarantinho, Amarante.

O Cap.Tomás, de férias na metrópole em Março de 1969 visitou a família do Mendes apresentando condolências.


Comentários
Acácio Gomes Tomás.ex-Comandante da C.Caç. 2418, 03/04/2015, 23:42
Em face da morte, no dia 21/11/1968, do Manuel Peixoto MENDES e como à data não estava definido se o Estado assumiria as despesas das trasladações dos corpos para a Metrópole, foi decidido, em formatura geral da 2418 que todos contribuiriam, proporcionalmente aos seus soldos, nos custos desta ou de outra baixa. Posto isto, foi chumbada a urna em que o Mendes foi colocado, depois de vestido, por mim e pelo Soldado Condutor Barbosa, com a farda levada de Massangulo. Quanto aos seus bens, foi tudo metido numa sua mala de lona e um carpinteiro fez, à medida, uma caixa de boa madeira. Depois fez-se uma relação dos haveres (Fio de ouro, Relógio, etc..,) foi por mim assinada e o caixote bem pregado, e foi cintado com cinta de aço, com o símbolo da RMM (Reg.Mil.Moçambique) e encaminhada para Vila Cabral. Tendo marcado férias para Março/1969, desloquei-me do Porto a Amarantinho, freguesia de Fregim, Amarante, para apresentar as condolências de toda 2418. Perguntei se a urna já tinha chegado e relatei o que tínhamos decidido sobre as trasladações. Disseram-me que não e mostraram o que tinham recebido. Um caixote bem conservado, mas a mala ANAVALHADA, na parte oposta à Tampa e " aliviada " de tudo que tinha valor...Era só procurar pois levava o inventário!!! Envergonhado, revoltado e furioso, ainda mais se, possível, fiquei quando me mostraram os restos da fita de aço, não da RMM, mas do Depósito Geral de Adidos, em Lisboa. Reparem no MILAGRE: a fita com R.M.MOÇAMBIQUE, de Massangulo até LISBOA, transformou-se em Depósito Geral de Adidos (DGA). Programei o regresso, indo por Lisboa para me deslocar ao DGA. Fui recebido pelo Sr. Comandante e manifestei a minha vergonha ao ser confrontado, pela Família, com o roubo, feito por Abutres, Aves de Rapina, ou Pessoas Cruéis. Rapei do meu último trunfo: A cinta do DGA (Lisboa), quando nós usámos a da RMM... Depois de pensar um pouco, disse-me que tinha plena confiança, no seu Pessoal e o Chefe até já lá trabalha há muito tempo! (Eu só pensei: POIS!). Arrependi-me de não ter feito isso por escrito.


24.Jan.1969 - Informação do Comando
Recebemos informação, pelas 13h, que o Comando da Frelimo, no Freixo, havia ordenado acções de ataques ao aquartelamento de Massangulo. 
De imediato se fizeram os preparativos para “receber” o inimigo. Estávamos todos muito stressados com esta situação. Apesar dos esquemas montados e das nossas vantagens estratégicas o receio era muito… e a este chama-se medo! 
Nos dias seguintes nada aconteceu…ainda bem!
Preparação de abrigo
























Entretanto recebemos a informação que a Base de Catur iria ser desmantelada, por incompatibilidade entre os chefes. Da morte do líder da Frelimo (Mondlane-3Fev69) resultou um novo líder (Simango) que, por ser Maconde, se dedicará mais a Cabo Delgado. Pensamos que esta situação pode ser boa e muito conveniente para nós. Será verdade? Veremos no futuro. 

Nota: Na verdade isto foi treta porque, um mês depois, fomos destruir a Base de Catur bem recheada de recursos.

COMENTÁRIOS
Manuel Silva (Lima) 15.04.2015-Lembra-me de reconstruir este abrigo, quando «fomos atacados» era um ver se te havias a entrar para o abrigo, eu ao entrar levei uma cabeçada nas costas que fiquei uns momentos sem ar. Mas correu tudo bem não tivemos mortos nem feridos

 

 O CARACOL 
Zona de referência para as nossas tropas especialmente pelas suas curvas e contra curvas, propícias a emboscadas (houve muitas) e minas. Zona por nós sistematicamente controlada e vigiada; local de lançamento de Grupos para operações da zona; local de passagem para as companhias localizadas mais a Norte (Lione). 



26 e 27.Fev.1969 - OPERAÇÃO S.JORGE
INTRODUÇÃO: 
Esta operação, “Missão de Assalto e Destruição da Base Geral do Catur”, foi preparada pelo Major Beirão, então Cmt. Interino e Oficial de Operações do B.Caç.1936 em Catur. Fomos informados do armamento da Base (até tinham canhão sem recuo) e do seu efectivo (cerca de 300 elementos). O guia (Ex Frelimo), que o fomos buscar à PIDE em Mandimba, apesar de nunca ter estado na Base sabia da localização aproximada, pois estivera numa reunião na TANZÂNIA onde a mudança e localização foram decididas. Esta operação “S. JORGE Z” foi preparada pelo Batalhão para execução nos dias 26 e 27.Fev.1969 pela nossa companhia.

A OPERAÇÃO: 
94 operacionais ocuparam as cinco viaturas que avançaram até à picada do Chinês, ainda longe do objectivo para evitar alertar o inimigo com o ruído das mesmas. Iniciamos a marcha preocupados mas confiantes na surpresa e do seu sucesso. Seguia connosco um Cabo das Milícias locais cuja missão foi acompanhar, preso por uma corda à sua cinta, o guia Ex Frelimo. 
Iniciamos a caminhada em picada e de seguida a corta-mato para noroeste. Com chuva durante todo o percurso, paramos pelas 18h30 e instalamos-nos num morro para comer e descansar um pouco. A partir das 22h00 uma brisa gelada e húmida fustigou o nosso corpo não nos deixando dormir. Cerca das 3h00 reiniciamos a caminhada… e a chuva também. A progressão foi difícil, era noite cerrada e o mato denso. Fizemos uma nova paragem. Reiniciamos, cerca das 5h00, já com alguma claridade e o guia informa que estaríamos perto da base e alerta para dar atenção às sentinelas. De repente um tiroteio na frente da coluna… um sentinela foi surpreendido e fez fogo… e nós também. Continuamos sem saber onde era a base mas estávamos seguros que era por perto. Atravessamos o rio e um pouco mais à frente deparamos com a Base Geral de Catur, reconstruída há cerca de um mês. Fez-se fogo em toda a frente… um tiroteio infernal. Alguns minutos depois concluímos estar abandonada pois foram alertados pelo tiroteio anterior e fugiram apressadamente, para o Malawi, descendo uma encosta e abandonando a Base sem resistência. Foi feita busca em todas as palhotas (cerca de 50) que, depois de retirados todos os materiais de interesse, foram queimadas. O regresso foi de grande sacrifício… estávamos cansados. Chegamos às 13h00 à estrada de Lione onde nos esperavam as viaturas. Foi triunfal a nossa chegada ao aquartelamento. Esperavam-nos o Major Beirão, do BC1936, muito entusiasmado com o nosso trabalho e os nativos que, em grande número, dançavam no seu estilo em círculo, com mulheres e homens em separado. Nesta operação capturamos importante material: Metralhadora Ligeira Degtyarev RPD com carregador e munições, Kalashnikov com 6 carregadores, 4 pistolas (3 Tula Tokarev + 1 Strakonice), 6 carregadores de pistola, 100 munições diversas, 4 granadas de mão defensivas, 10 cantis, binóculos, fardamento, calçado, medicamentos, 2 pastas com documentos diversos (alguns muito importantes) e outros materiais.


Nota: A Operação correu bem e não tivemos feridos. A Base estava desfalcada, pois tinham partido nesse mesmo dia para surpreender uma Companhia em Lione, a 60 Km, perto do lago Niassa

Acácio Tomás - Faz amanhã, dia 26-02-2017, quarenta e oito anos, que iniciámos a Op. São Jorge. Embora as fotos que registaram a partida em viaturas, não mostrem isso, eram grandes as preocupações e medos, face às informações recebidas do Comando. Largados à distância , subimos um morro onde esperávamos descansar e até dormir ... O frio era tremendo ... O pessoal não parava de bater os pés ... Tivemos de reiniciar a marcha, apesar do Guia dizer que estávamos muito perto do local previsto. Tivemos de prosseguir e lá seguimos até encontrar os sentinelas. Felizmente tudo correu bem. Não tivemos beliscaduras e capturámos Armas, Documentos e Fardamento ... O regresso foi feito com mais despreocupação e satisfação ... 25.02.2017


26.Fev.1969 
No seguimento da Operação S.Jorge 
O texto anterior, sobre esta nossa operação, encerra com a frase: 
“A Base estava desfalcada, pois tinham partido nesse mesmo dia para surpreender uma Companhia em Lione, a 60 Km a Norte, perto do lago Niassa” 
Ora em Lione estava a C.Cav.2415 e no seu Blogue encontramos um texto do Avelino Torcato Pereira que refere: 
“Era da parte da tarde do dia 26 de Fevereiro de 1969 em Lione. 
O pessoal encontrava-se todo à volta do campo de futebol a assistir entusiasmado a uma animada partida entre dois pelotões quando, de repente, começámos a ouvir ao longe, mais precisamente na serra que ficava virada para os lados de Chala, o som do rebentamento de granadas.
A malta apanhada de surpresa e sem perceber bem o que se estava a passar deitou a correr a toda a pressa para dentro do quartel a fim de se abrigar. Já refeitos da surpresa e só  concentrados naquela zona  e no impacto dos projécteis deu para perceber que eram granadas de canhão sem recuo que eles usavam e só  podiam  ser-nos  dirigidas, apesar de rebentarem a uma certa distância  do aquartelamento. Foram  sete rebentamentos que nos deixaram perplexos e "à rasca". 
Ainda bem que o inimigo não sabia manejar tal ferramenta, caso contrário a tarde de futebol podia ter sido sangrenta.”


Acácio Gomes Tomás - Confirmam-se as informações que recebi:  1ª-Que a Base de Catur tinha um Canhão sem Recuo, conforme me disse o saudoso Major Beirão; 2ª-Que a Base estava desfalcada... Para fazerem 60 km a pé, demoram mais de 12 horas na ida e outras tantas na volta, quando chegaram à sua Base, encontraram-na destruída.


14.Mar.1969 - Base do Chala
Uma outra base para destruir e desta vez a de Chala – operação INSISTINDO Z.
Arrancamos às 12h… fomos deixados na picada do Chinês pelas 13h e caminhamos, em percurso mais ou menos plano, até às 19h. Às 4h15 do dia 15 reiniciamos a marcha, ainda escuro… terreno muito acidentado, muitos rios para atravessar… quase sem paragens caminhamos até às 13h30… a Base nem vê-la, estávamos esgotados… chegamos a pensar que o guia (Ex Frelimo) nos estava a enganar.
Transmitimos o nosso desespero ao comandante da operação (Gama Henriques?), também ele esgotado… resolveu-se regressar cerca das 14h00 (já não havia que comer pois a operação estava prevista apenas para um dia). Começou a chover torrencialmente, o que se prolongou por duas horas; os caminhos tornaram-se regatos, os regatos em pequenos rios… a caminhada tornou-se ainda mais difícil porque os caminhos já não estavam visíveis. 
Cerca das 18h45 um soldado desmaiou de fadiga e a coluna teve que parar enquanto a outra metade, alheia ao facto, seguia a sua caminhada… veio a noite e aumentaram as dificuldades… outra chuvada vem atormentar o nosso andamento… maior era o desespero. Os pés doíam e a G3 tinha atingido um peso brutal. Às 20h00 chegamos à picada do Lione mas o nosso ponto de recolha era na picada do Chinês…seguimos em frente. O regresso, já nas viaturas com chuva intensa e contínua, demorou cerca de duas horas até ao aquartelamento. Chegamos, por fim, satisfeitos, não de ter cumprido a missão mas sim porque finalmente iríamos descansar. 
Nesta operação estivemos tão próximos do Lago Niassa que, aquando da decisão do regresso, ainda foi possível admirar um por do sol fabuloso e absolutamente inesquecível e ainda, porque regressamos por um percurso diferente, passamos por uma zona com um embondeiro gigantesco, também imemorável.

Mato denso e sinuoso
Por do sol do Lago Niassa
Embondeiro gigantesco (a imagem do militar evidencia o seu tamanho)

COMENTÁRIOS:
Francisco Lopes (Chico) - Obrigado por trazeres estas imagens do embondeiro tinha uma dimensão enorme. Também me recordo muito bem essa operação falhada. O guia guerrilheiro da Frelimo dizia-nos sempre que ficava atrás da montanha a seguir e foi assim sucessivamente até à desistência bem perto do lago Niassa.
Maldonado Neto - Realmente é inesquecível a beleza destas fotos com que nos presenteaste, muito obrigado.
José Diegues - Obrigado. Recordo bem essa e outras operações no mesmo grupo. Abraço.


19.Mar.1969 - Recolha de material de guerra
Resultante de informação recebida e com o auxílio de um guia fomos buscar armamento escondido no mato, no lado de lá. 

 
                 4 espingardas semiautomáticas, 6 pentes de munições e 2 granadas de mão.


26.Mar.1969- Operação Retorno 
Na Operação S.Jorge, em 26 e 27Fev68, não conseguimos apanhar nenhum inimigo pois tiveram tempo de fugir devido ao tiroteio com a sentinela. 
Foi planeada uma nova operação -RETORNO- com vista a inspecionar a ex-Base de Catur destruída na operação S.Jorge. 
Lançados na picada do Chinês, onde seríamos recolhidos no dia seguinte.
No início da caminhada foi avistado um grupo inimigo que fugia… fomos detectados! 
A distância entre nós era enorme mas assim mesmo fizemos fogo sobre eles. Desapareceram! Organizamos uma batida à zona onde os havíamos visto. Na batida encontramos um morto, com uma espingarda automática, uma bazuca com a respectiva granada, uma granada mão e outro material. Satisfeitos com este sucesso regressamos ao aquartelamento. 
A Operação RETORNO não foi concluída. 

Nota: Posteriormente soubemos que tínhamos atingido mais dois inimigos, um deles com gravidade.


 

Nesta data completamos 15 armas capturadas ao inimigo.


16.Abr.1969 - A PRIMEIRA MINA  
A sorte tem-nos protegido!
Numa saída, e já em plena picada do Chinês, a viatura accionou uma mina. Felizmente não resultou nada de grave embora o Furriel Patrício e um soldado(?) ficassem ligeiramente feridos.
E porquê a sorte?
O rebentamento foi da granada que por sua vez explodiria o trotil que estava junto (rebentamento por simpatia). A sorte foi que o trotil estava deteriorado e por isso não explodiu. Para os que faziam parte dessa coluna foi um acontecimento assustador… o rebentamento integral da mina provocaria danos traumatizantes.
Que susto!!!

Nota: Não há registos fotográficos deste acontecimento, nem da própria picada do Chinês.



05.Mai.1969 - Emboscada à C.Cav.2415
Na tarde desse dia, fui apresentado, pelo nosso Sargento Pinto, aos dois graduados da C.Cav.2415, Sargento Carvalho e Furriel Santos, que regressavam do Catur quando eu saía do meu quarto, mesmo ao lado da Secretaria.
Conversámos uns minutos e como a Berliet, em que vinham, tinha chegado antes do Unimog, também partiu antes, mas este não demorou.
Seriam cerca das 16 h, mas havia o Caracol para passar...
Poucos minutos, depois, sentimos no nosso Quartel um grande estrondo!
Rapidamente saíram em socorro  vários militares da C.Caç.2418, numa Berliet. Desconheço quem foram os meus Graduados que seguiram, pois eles é que se auto nomearam.
Não demorou muito o regresso da nossa viatura e do Unimog, com vários feridos e os Graduados da C.Cav.2415 mortos, com tiros na nuca.
Militares, de ambas as Companhias, ficaram de guarda à Berliet atingida e fora da picada.
Como me contaram a emboscada estava localizada entre Kitamba (que nós chamávamos Ananases) e o Caracol, montada do lado esquerdo (no sentido Massangulo - Lione)  para ser mais fácil a fuga e numa zona plana. A Bazucada  foi disparada por um indivíduo que saltou para o meio da picada, impedindo qualquer reacção. Com o rebentamento tão próximo, mesmo o pessoal não atingido, ficou atordoado e incapaz de reagir. Por isso, os tiros na nuca, dos graduados.
De seguida, o pessoal da minha Secção Auto foi rebocar a Berliet, depois de lhe ter substituída a roda atingida.
O nosso Posto de Socorros e a Secretaria ficaram transformados em Enfermaria e Morgue!

Reparem no para brisas os impactos das balas que tinham vitimado o Santos e o Carvalhinho na emboscada do Caracol

Nota final:
Lembro-me que o nosso 3º Pelotão (Alf.Ferreira Gomes) tinha lá passado depois do meio-dia, em duas viaturas, ao regressar duma operação... e claro, de manhã e mais cedo, tinham lá passado as duas viaturas da C.Caç.2415. O inimigo, provavelmente, esperaria o seu regresso a Lione. 
É tudo o que posso recordar daquele triste dia.
Sei que as Cerimónias Fúnebres foram realizadas na Igreja de Nossa Senhora da Consolata (MASSANGULO) que, depois da Independência, passou a MONUMENTO NACIONAL de Moçambique. 
Ex Cap.Acácio Tomás

Comentários
Um grave acidente com um grupo da Companhia residente em Lione, que esteve no nosso quartel de passagem.
Iniciaram o regresso para o seu quartel e, passado pouco tempo, quando os nossos soldados estavam já no refeitório a jantar, ouviram-se grandes explosões lá ao longe. Era ver os nossos soldados a largar as marmitas e a saltar para as viaturas para ir em socorro daquela Companhia. Houve mortos (2 ou 3, um dos quais era Sargento) e muitos feridos, quer civis quer militares. Foi um fim de tarde terrível.
Eram tantos os feridos e a azáfama era tão grande que houve necessidade de virem reforços do Catur. Sem esse apoio seria uma missão quase impossível socorrer tanta gente naquele pequeno Posto de Socorros.
 

Fernando Lopes - Furriel Enfermeiro

A.Castro da C.Cav.2415- Lione - Relativamente à emboscada efectuada às viaturas da C.Cav.2415 da qual resultou na morte de 2 militares, a vossa descrição do acontecimento é mais abrangente e dá a conhecer novos tópicos. Por isso vos agradecemos reconhecidamente tamanha colaboração duma tragédia que ainda hoje se mantém viva na memória de todos. Muito obrigado



Dentro de toda aquela desgraça ocorrida a 5 de Maio de 1969 (2ª feira) – Emboscada à C. Cav. 2415 (Lione - Niassa - Moçambique) e suas consequências, houve um momento que jamais poderei esquecer por ter sido uma situação ímpar e de uma aflição atroz. 
Enquanto se socorria todos os elementos daquela Companhia afectados pela referenciada emboscada e se aguardava por ajuda que haveria de chegar da C. C. S. do Catur (o caso era muito sério e as necessidades de socorro eram enormes), apareceu-me no Posto de Socorros um soldado da mesma Companhia que, manifestando um estado de nervosismo extremo, involuntariamente perturbava com as suas “investidas” o bom desenrolar dos serviços de socorro.
Queria dizer-me qualquer coisa!...
Aparentemente não tinha nada, não estava ferido, mas o seu estado de choque não lhe permitia dizer o que quer que fosse.
Com a sua impertinência, que era acentuada, sentia-me bastante embaraçado em prestar a melhor atenção aos seus camaradas feridos.
Por via disso senti-me forçado a afastá-lo com alguma “veemência”, pedindo que não se aproximasse, o que fez.
Decorridos alguns dias a C. Cav. 2415 passou novamente por Massangulo e o tal soldado, muito pesaroso e com ar de envergonhado, procurou-me para me dar uma explicação.
Afinal o que ele me queria dizer cingia-se a uma manifestação de contentamento por nada ter sofrido no ataque à sua viatura já que ia no meio do Sargento Carvalho e do Furriel Santos, que faleceram, e ele escapara sem qualquer ferimento ou arranhão. “Que sorte eu tive, meu Furriel” (Sic).
Obviamente que compreendi o estado de inquietação daquele amigo. O momento foi trágico e assustador. Desejei-lhe boa sorte para o futuro e lá nos despedimos. 
Não sei o nome dele, não me lembro de quem era, mas registei na minha memória toda aquela situação amarga e triste.
2019.02.08.Cumprimentos para todos os elementos da C. Cav. 2415 com um abraço amigo do FERNANDO LOPES (ex. Furriel Enfermeiro da C. Caç 2418).



16.Mai.1969 - Operação Furão 
Guiados por um ex-Frelimo, que se entregou no nosso aquartelamento no dia 14Mai69, iniciamos a Operação Furão. 
No dia seguinte encontramos a nova Base de Catur (abandonada na hora), com cerca de 50 palhotas (algumas ainda em construção) que foram todas destruídas. 
Capturamos 1 espingarda automática, uma granada de mão, munições, 7 cantis, fardamentos, roupas e medicamentos
Nota: Não há registos fotográficos do local e do material capturado. 


Jun.1969 - Nani 2
Numa outra operação (Jun.69) à zona do Nani, encontramos uma aldeia, embora abandonada e decadente, em que as paredes das palhotas (que tipicamente são da cor da terra lamacenta) estavam pintadas com diversos desenhos e temas locais com cores claras e muito interessantes. Nesta operação e a partir da aldeia do Nani resolvemos fazer o caminho a “corta-mato” e deparamos com um espectáculo que nos deixou receosos. Uma enorme zona, provavelmente plantação da bananeiras, estava completamente arrasada pela passagem de elefantes que deveriam ser em grande número. Das bananeiras, nem uma estava de pé e algumas árvores estavam lamacentas, pelo roçar do corpo dos elefantes, a uns 4 metros de altura. O mato derrubado e os grandes “pastelões de fezes”, ainda quentes, eram a prova clara de que teriam passado ali recentemente… assustador… arrepiante! 
Nesse dia paramos e dormimos em Mitamba.
 


Foi também numa outra operação, creio que ao Nani, que fomos lançados num domingo e recolhidos no domingo seguinte (8 dias 7 noites). Durante TODA a operação fomos fustigados com chuvas permanentes e intensas, regatos transformados em rios, trilhos desaparecidos e a passagem para a outra margem vestidos e com a arma em cima da cabeça, dormindo em cima de rochas e/ou encostados às árvores. Várias vezes dissemos… “vamos pagar bem caro este sacrifício”.




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Fernando Carvalho - Estes registos, de algumas das nossas operações em Massangulo, traz-me à memória o meu desalento relativamente à nossa missão, estando apenas há 2/3 meses em Moçambique. Em verdade a informação que recebíamos, na Metrópole, no dia-a-dia induzia-nos à defesa dos territórios ultramarinos (chamava-se "propaganda"). Eu mesmo me lembro de me sentir na obrigação de defender aqueles territórios e concordar com o envio de tropas e a eliminação dos chamados “terroristas”. Mas durante a nossa missão lembro-me que, em muitos momentos, ter assumido que "afinal nós é que estamos aqui a mais... isto não nos pertence". Porém não podíamos (era proibido) exteriorizar os nossos desacordos com o regime e por isso, muitos como eu, calamos e cumprimos. Creio que este pensamento (que não era exclusivamente meu) contribuiu para a postura de respeito com as populações com quem convivi durante toda a nossa missão. (27.07.2015) 

Francisco Lopes Era uma realidade em muitos de nós. Infelizmente tivemos de aguentar calados. Apesar do tempo já passado publicar este pensamento revela alguma coragem. Parabens Carvalho (04.08.2015)

Fernando Lopes - Os horizontes que na altura nos permitiam eram de capoeira, baixos e curtos. Porém, a vida faz-se de conquistas alargando-se, assim, tais horizontes para uns mais longos e bem longínquos. Horizontes de montanha. Um abraço caro amigo Carvalho. (05.08.2015)

João BalagueirasTive o mesmo sentimento, um abraço BALA (05.08.2015)



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